Amor, luto e o cuidado como condição humana: Minha jornada na criação solo dos filhos

Sou Rafael Stein, pai da Maria Clara e do Francisco. Hoje, nada é mais importante para mim do que meus filhos, e todas as outras funções que desempenho são para sustentar o exercício da paternidade. Após a perda da minha esposa há cinco anos, precisei reconfigurar minha vida para assumir totalmente o cuidado dos meus filhos. Nesse processo, senti a necessidade de rever minha masculinidade para lidar com o luto, com a rotina das crianças e com a falta de repertório para exercer o cuidado. Encontrei na escrita caminhos para a cura e mais uma forma de cuidar de mim e dos outros.

A Transformação da Paternidade

“Antes eu exercia a paternidade a três ‘P’: procriar, proteger e prover. Eu não sabia cuidar.”

Antes do diagnóstico de câncer da minha esposa, minha visão de paternidade se limitava a esses três “P”. Eu acreditava que cumprir esses papéis era o suficiente para ser reconhecido como homem pela sociedade. No entanto, a necessidade de cuidar da minha esposa durante o tratamento e, posteriormente, dos meus filhos sozinho, fez com que eu percebesse a importância de aprender a cuidar.

O Diagnóstico e a Redefinição da Paternidade

“Eu acho que o diagnóstico separa uma paternidade que antes era exercida a três ‘P’: procriar, proteger e prover. Isso era a definição do ‘se eu faço isso eu me reconheço como homem, me reconhecem como homem’. Para mim, ali tinha um conflito muito grande: ‘Eu vou cuidar deles, eu preciso cuidar dela, só que como eu cuido? Eu não sei cuidar’.”

O impacto do diagnóstico de minha esposa em minha visão de paternidade foi imenso. Eu me vi diante do desafio de aprender a cuidar, algo que nunca havia feito antes. Esse processo de aprendizado começou com pequenas ações diárias, como acordar mais cedo para preparar o café da manhã e chegar mais cedo do trabalho para estar presente na rotina das crianças.

A Magia do Cuidado

“Só que quando você se coloca nessa posição de cuidado algo mágico acontece. Eu falo que a gente se apaixona. É uma troca. Você dá amor e você recebe amor. E nessa troca eu me apaixonei pelos meus filhos, pela minha esposa.”

Ao me colocar na posição de cuidador, descobri uma conexão emocional profunda com meus filhos e com minha esposa. Através das pequenas ações diárias de cuidado, eu descobri um novo nível de amor e vínculo.

A Realização do que Estava Perdendo

“Eu não tinha consciência quando estava vivendo isso, mas hoje eu vejo o quanto eu estava perdendo uma parte importante da minha vida por estar preocupado em prover, em cuidar da casa nesse sentido de trabalhar muito para poder dar o que eu achava que era melhor para minha família. E a gente vai fazendo isso no automático porque era isso o que era esperado de mim como homem pela sociedade. Se eu faço isso eu tô cumprindo meu papel.”

Refletindo sobre o passado, percebo que minha preocupação em prover financeiramente para a família me fez perder momentos importantes de conexão e cuidado. Eu estava vivendo no automático, seguindo o que a sociedade esperava de mim como homem, sem realmente estar presente para minha família.

A Jornada de Autoconhecimento e Redefinição de Valores

“Quando eu me coloco nesse lugar de cuidado e penso no pai que eu quero ser, eu também passo a questionar que homem que eu sou. Porque antes de ser pai eu sou homem e o homem que eu aprendi a ser não dava conta de viver aquilo. Não dava conta de vivenciar o luto que eu estava vivendo, não dava conta de cuidar das crianças. Eu tive que aprender mesmo.”

Foi essencial questionar e redefinir minha masculinidade para me tornar o pai que desejo ser. Reconheço que o homem que eu era antes não estava preparado para lidar com o luto e com o cuidado diário dos meus filhos. Essa jornada de autoconhecimento me levou a rever valores e comportamentos enraizados.

A Importância do Tempo e da Presença

“Tem uma frase que diz que ‘Não importa o tempo, o que importa é a qualidade’. Eu não sei. Eu acho que importa o tempo sim. Temos uma questão de ter mais tempo, mais tempo presente no presente. Porque muitas vezes a gente está junto e tá com a cabeça em outros lugares, mas acho que o vínculo com as crianças, especificamente, se dá no cuidado, nas pequenas coisas do dia a dia.”

Refletindo sobre a importância de estar presente de forma qualitativa e quantitativa, percebo que o vínculo com meus filhos é construído nas pequenas ações diárias e na presença constante, não apenas em momentos grandiosos ou planejados.

A paternidade pode ser transformadora. Ao aprender a cuidar e a estar presente, descobri novas formas de amor e redefini minha masculinidade. Minha história nos lembra da importância do cuidado como uma condição humana essencial e da necessidade de questionar e romper com padrões de masculinidade impostos pela sociedade.